Oportunidade à vista - Trabalho dá nova chance a presos
Por Gabriela Rovai (Diário Catarinense, 28/4/2013)
Com 40,4% dos detentos ocupados, SC lidera ranking de atividade laboral
nas prisões do país
A atividade laboral é o principal
caminho para a ressocialização de presos e, neste cenário, Santa Catarina é o
estado com maior número de detentos trabalhando, conforme dados do Departamento
Penitenciário Nacional (Depen), do Ministério da Justiça, divulgados na última
semana. Segundo o levantamento, o Estado ocupa 40,4% de sua população
carcerária.
Um índice positivo, visto que
apenas 20% dos encarcerados do Brasil têm tal oportunidade. Para avançar ainda
mais, a sociedade civil precisa se engajar à causa e ainda obter vantagens
econômicas com isso.
Empresas que contratam detentos
como mão de obra têm feito um bom negócio. Entre as vantagens estão a economia
com a folha de pagamento, já que os presos dos regimes semiaberto e fechado não
trabalham com carteira assinada, pois eles não estão sujeitos ao regime da Consolidação
das Leis do Trabalho. Dependendo do piso salarial, a economia pode chegar a
50%. Isso porque os empregadores têm incentivos legais. Eles são isentos de
encargos trabalhistas como FGTS, férias e 13o salário.
A remuneração mínima corresponde
a três quartos do salário mínimo. Normalmente, nos convênios firmados entre
empresas e presídios, é estipulado um salário mínimo como pagamento.
Contudo, o limite máximo de
contratação de detentos pelas empresas é de 10% do total de empregados da obra
ou serviço, conforme estabelece a Lei de Execuções Penais. A regra não tem
validade para egressos do sistema penitenciário.
Disciplina é um dos diferenciais
Entre as vantagens obtidas pelo
empregador estão a disciplina e o comprometimento dos presos com o trabalho.
Encarregado das oficinas da Mormaii no Presídio Regional de Blumenau, Lúcio
Pires destaca a qualidade da mão de obra.
– Prefiro trabalhar com os
presos, porque têm mais disciplina e respeito. Tudo que eu peço eles fazem –
disse.
A Mormaii montou uma estrutura de
fábrica na unidade, com ferramentas e prensa pneumáticas e compressor com
ar-comprimido. Ali ninguém ganha menos que um salário mínimo.
Assim como em outros convênios,
parte da remuneração é depositada numa poupança para ser retirada quando o preso
sair e outra parte para indenizar danos causados pelo crime cometido pelo
detento.
O gerente industrial da Mormaii,
Ronaldo Gerent, observa que é vantagem o trabalho com presidiários por seu foco
e capacidade produtiva e pela escassez de mão de obra e falta de capacitação de
candidatos no mercado. Ele afirma também que a empresa está aberta à
contratação de egressos.
– A experiência na unidade é
excelente. E egressos que quiserem trabalhar na Mormaii só precisam procurar o
setor de recursos humanos. Hoje tenho 40 vagas. Se hoje saíssem 40 homens com o
perfil necessário, estariam empregados – diz Gerent.
O Estado possui convênios com
empresas e entidades como a Mormaii, Fischer, Tashiba, Instituto de Estudos e
Pesquisas sobre Violência e Criminalidade de Itajaí, Hering, Da Cor do Pecado,
entre outras. E está aberto a novas parcerias para melhorar ainda mais o índice
catarinense.
Material até para exportação
Venezuela, República Dominicana e
Paraguai são destinos dos biquínis produzidos por detentas do Presídio Regional
de Itajaí. Uma sala arejada e bem iluminada com carretéis coloridos, máquinas
de costura profissionais e tecidos de diferentes padronagens é a oficina da
empresa de moda praia Da Cor do Pecado.
Lá dentro, 26 mulheres produzem
cinco mil biquínis e saídas de praia por mês em turnos de seis horas por dia.
Elas são as costureiras da marca e receberam treinamento para isso. Algumas já
sabiam costurar. É o caso de Érica de Lima, 29 anos, que aprendeu o ofício aos
14 e chegou a trabalhar com moda infantil.
Condenada a seis anos de prisão,
ela diz com orgulho que é overloquista.
– É o início de toda peça.
Recebemos o modelo e os tecidos cortados. Meu trabalho é montar os biquínis que
podem ser usados dos dois lados – explica.
Para Érica, o trabalho mantém a
mente ocupada, ensina disciplina e a respeitar o espaço uma da outra. Ela
garante que muitas mulheres querem trabalhar.
Outras experiências positivas
No Presídio Regional de Blumenau,
o sonho de Isaías Lopes, 44 anos, é simples: buscar a filha de 12 e o netinho
de seis na escola. Cumprindo o sexto ano de detenção e atualmente no regime
semiaberto, o pintor predial pode conquistar mais rápido seu objetivo com a
remissão da pena de 34 anos por meio do trabalho. Há sete meses, ele foi um dos
escolhidos para trabalhar na oficina da Mormaii, uma das principais marcas de
surfwear do país, onde são produzidas cerca de 1,2 mil rodas e média de 300
bicicletas por dia.
Na Penitenciária do Complexo do
Vale do Itajaí, Marcos de Oliveira, 39, Emerson Alves, 31, e Luiz Carlos dos
Passos, 39, são os primeiros participantes de outro projeto do Departamento
Estadual de Administração Prisional (Deap). É o Cadeirantes em Ação, piloto
desenvolvido na unidade e que servirá de referência para o sistema prisional
catarinense. A ideia vai além de encontrar uma ocupação para presos que usam
cadeira de rodas: deve aproveitar mão de obra qualificada e oportunizar a
inserção na sociedade.