Prisões suecas: aqui se reabilitam seres humanos
País fecha cárceres, por falta de detentos, e
comprova: presídios bárbaros só alimentam ódios; para combater criminalidade e
reincidência, receita é outra
Por Cibelih Hespanhol
Quando Alexander Petrovich, assassino
confesso de sua própria mulher, viu-se encarcerado entre as paredes de um
presídio na Sibéria, passou a conhecer o dia-a-dia, detalhes e hábitos deste
sistema.
E escreveu as seguintes linhas em seu
diário pessoal: “não resta dúvidas de que o tão gabado regime de penitenciária
oferece resultados falsos, meramente aparentes. Esgota a capacidade humana,
desfibra a alma, avilta, caleja e só oficiosamente faz do detento ‘remido’ um
modelo de sistemas regeneradores”. Se Alexander e sua história pertencem ao
romance Recordações da Casa dos Mortos, de
Dostoievski, publicado em 1860, seu drama ainda pode ser considerado
absurdamente atual.
As recentes notícias sobre o
fechamento de quatro prisões suecas reabriram discussões sobre a forma como
lidamos com nossos detentos. Isto porque a falta de presos no país nórdico é
atribuída principalmente à forma de organização de seu sistema penitenciário,
que conta com investimentos na reabilitação dos prisioneiros; adoção de penas
mais leves em delitos relacionados a drogas; e revisões judiciais que optam por
penas alternativas em alguns casos, como liberdade vigiada.
Em situação semelhante, a Holanda já
havia anunciado em 2012 a necessidade de fechar oito prisões e demitir mais de
mil funcionários – pelo mesmo motivo: suas celas estavam praticamente vazias. O
que tem a nos dizer estes países?
Brasil e EUA
Em sentindo inverso, nos Estados
Unidos, país com maior população carcerária do mundo, o número de detentos
chega a praticamente 2,3 milhões. E a taxa de reincidência é de 60% – ou seja,
a cada dez pessoas que saem da prisão, seis voltarão para o crime.
O Brasil, que ocupa o quarto lugar no
ranking de população carcerária, possui cerca de 500 mil presos, num índice de
274 detentos por 100 mil habitantes. Além disso, o número de detentos é 66% maior
do que a capacidade que o sistema brasileiro possui de abrigá-los nas prisões.
Em junho do ano passado, a ONU declarou em relatório oficial a necessidade do
país “melhorar as condições de suas prisões e enfrentar o problema da
superlotação”. Casos de violação dos direitos humanos, torturas físicas e
psicológicas são recorrentes em presídios brasileiros: no Rio de Janeiro, um
preso é morto a cada dois dias, principalmente de tuberculose e AIDS.
A abismal diferença entre prisões
suecas e brasileiras (ou norte americanas) está nas teorias que fundamentam
seus sistemas penitenciários. O país da pena de morte é o mesmo que viu sua
população carcerária praticamente dobrar desde o início dos anos 90. Já o país
que optou por uma política de reinserção social, em que uma agência
governamental é encarregada de supervisionar os detentos e oferecer programas
de tratamento para aqueles com problemas com drogas, vê agora suas prisões
serem fechadas por falta de prisioneiros.
Em entrevista ao The Guardian,
Kenneth Gustafsson, governador da prisão de Kumla, a mais segura da Suécia,
declara: “existem pessoas que não querem ou não podem mudar. Mas na minha
experiência a maioria dos prisioneiros quer mudar, e nós precisamos fazer o que
pudermos para ajudá-los. E não é apenas a prisão que pode reabilitar. Isso é um
processo combinado, que envolve a sociedade. Podemos dar educação e
treinamento, mas quando essas pessoas deixam as prisões elas precisam de
moradia e emprego”.
Em suma, o que a Suécia tem a nos
ensinar é a noção contrária do senso comum de que “cadeia boa é cadeia
infernal”: optar pela humanização do sistema penitenciário prova-se como a
maneira mais eficaz de se verem reduzidos os índices de criminalidade. Ou nas
palavras daquele personagem de Dostoievski, de duzentos anos atrás: “E já que
[o detento] é de fato um homem, deve ser assim tratado. Um tratamento humano
pode até devolver a condição humana mesmo àqueles que se esquivaram…”.
(Fonte:
www.outraspalavras.net)
Veja
o vídeo do funcionamento das prisões suecas: