Resenhas de livros reduzem penas nas prisões
Da BBC Brasil em São Paulo
Álvaro Lopes Frazão conheceu o livro Marley & Eu na
cela onde está preso por homicídio. O romance americano sobre um labrador, com
final triste - há quem diga meloso -, emocionou o prisioneiro, e tornou-se seu
favorito: há anos trancado na cadeia, ele sente saudade de seu cachorro, Bob.
No dia 4
de junho de 2005, em uma discussão banal, Frazão esfaqueou um amigo.
"Tirei a vida de uma pessoa", afirma, evitando se colocar como o
sujeito atrás do verbo "matar". Doze anos depois, tenta lidar com a
culpa e com o arrependimento: usa a literatura como terapia.
Ele está preso no Centro de Progressão
Penitenciária de Hortolândia, um presídio do interior de São Paulo que, há
quatro anos, começou a trocar redução de pena por resenhas literárias escritas
pelos presos. No local, ocorre uma oficina de leitura e de escrita de resenhas
duas vezes por semana: os participantes - cerca de 30 - falam sobre os livros
que estão lendo e aprendem técnicas para organizar uma crítica literária.
Em 2013,
o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) publicou uma portaria que autoriza juízes
a diminuir penas dos presidiários que escrevam sobre os livros que leem. Nesse
período, já foram escritas mais de 6 mil resenhas - 5,5 mil pessoas já
participaram. Para cada texto, um detento pode se livrar de quatro dias na
cadeia - ele pode escrever uma por mês e 12 por ano.
O
projeto segue a Lei de Diretrizes Penais, que prevê remissão de penas por
trabalho e estudo. Segundo a resolução do CNJ, cabe aos governos estaduais
criar programas de leitura nos sistemas prisionais - o preso só pode participar
de forma voluntária.
Na
prisão, Álvaro diz que percebeu que assassinar o amigo também tirou parte da
sua vida: a liberdade da rua, o contato diário com suas duas filhas e a família
e com o cachorro Bob. "Sinto muita falta dele, manja? Se tudo der certo,
posso voltar a vê-lo, acho que ele está com uma vizinha", diz.
Quando terminou a leitura, ele teve alguns
dias para escrever uma resenha e, assim, conseguir reduzir em quatro dias o seu
período no cárcere: no texto, precisou explicar do que se trata a obra, quais
são personagens principais, se o narrador está em primeira ou terceira pessoa.
Também fez um julgamento crítico, dizendo por que gostou do livro, e se o
indicaria para outra pessoa.
A
crítica de Frazão foi então avaliada por um juiz, que autorizou a remissão. Ele
pode negar o benefício caso o preso copie a orelha do livro, por exemplo.
Depois
de resenhar Marley & Eu, Álvaro começou O espetáculo mais triste da
Terra, livro-reportagem de Mauro Ventura sobre um incêndio em um
circo de Niterói que matou 503 pessoas, em 1961. Para ele, conhecer o
sentimento de perda dos parentes das vítimas o ajudou a compreender o
sofrimento que causou ao matar o amigo.
"Você
lê sobre a mãe que perdeu o filho, a mulher que perdeu o marido", explica
Frazão, de 42 anos. "A princípio, eu não entendia o que eu fiz. Hoje eu
consigo, vejo que, na hora, não contei até dez, manja? Hoje entendo que causei
uma dor desnecessária... desnecessária."
Confira a reportagem completa neste link:
http://www.bbc.com/portuguese/brasil-41168306
Este projeto existe em Florianópolis?
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